domingo, 13 de março de 2016

De que me importa?

Eu nem sei qual era o ano ou o dia. Não sei se era primavera ou verão. Nem mp3 eu tinha ou qualquer dessas coisas tecnológicas em que você pode escolher a música que ouve. Tudo o que eu podia escolher era a sintonia da rádio e o volume, que nem era muito alto, o que já limitava a escolha.
Talvez eu tivesse treze ou quatorze anos, o que se pensar bem, nem faz tanto tempo assim, mas eu já agia como se soubesse de tudo na vida. Andava nas ruas como se tivesse uma confiança inabalável, o que não era verdade também.
Eu sei que eu ouvi a Marisa Monte traduzindo o que eu estava sentindo. Sei também que era noite, tinha estrelas no céu. De onde eu estava, eu via toda a rua, mais longe o campinho lá embaixo vazio, uma quadra onde uns garotos treinavam futebol, era longe o suficiente pra eu não conseguir contar quantos haviam.
Eu conseguia ver uma enorme quantidade de árvores do muro pra lá. Conseguia ver três escolas diferentes, antenas de operadoras. De um lado eu conseguia ver aquelas árvores bonitas que pareciam pinheiros de natal gigantes e até a represa dividida em duas partes.
Se eu enxugasse as lágrimas eu conseguiria ver até aqueles borrões marrons, que pareciam montanhas, mas não fazia sentido ter montanhas ali.
Eu sei que as luzes das ruas não eram mais aquelas brancas que ofuscavam a vista, eram alaranjadas, que davam um ar lindo para noite. Eu poderia ficar a noite inteira só olhando, mesmo que eu estivesse em pé.
A voz da Marisa me dava aquela sensação de que eu poderia chorar um rio inteiro, sem sentir raiva, só uma calmaria dolorosa. Como eu poderia saber de qualquer coisa? Eu era uma adolescente chorando por alguém que nunca me olhou. Ficava olhando para aquela ruazinha deserta, meio escondida como se ela fosse me levar para um passado que não existiu. 
Eu repetia com lágrimas nos olhos "...De que me importa ver você tão triste, se triste eu fui e você nem ligou..." 
Quem ligaria? Ninguém via. Eu escolhia as noites especialmente por essa razão e chorava inconsolável por um amor que eu nem conhecia. 
"... De que me importa seu carinho agora, se para mim a vida terminou..."
Ah! Como eu chorava com essa frase, como se meu coração estivesse sendo rasgado e a lágrima fosse curar. Eu que sempre gostei de solidão e melancolia, descobri não muito tempo depois, que ninguém morre de amores platônicos e paixões adolescentes, descobri que aquela ruazinha não me levaria nem para outro bairro, no máximo até o ponto de ônibus e o mais impressionante de tudo... Minha vida não tinha terminado nada! Era só a emoção de ouvir aquela canção e com aquela paisagem, que eu deixei de enxergar por causa das lágrimas e hoje eu sequer posso ver e quer saber? 
De que me importa isso, se é muito tarde para eu me perder?


Todos os direitos reservados. Sarah Ribeiro.